testeAntes de tudo vem a música

Escrevo profissionalmente sobre música, mas estou muito longe de ser um especialista em notas, escalas e acordes. Falta teoria, sobra prática. Ouço canções brasileiras desde que me entendo (ou não me entendo) por gente.

Em casa, quando eu tinha seis anos, meus pais alternavam os — desculpem a expressão, jovens — LPs na vitrola: se saía Meus caros amigos, de Chico Buarque, entrava Galos de briga, de João Bosco e Aldir Blanc. E vice-versa. Fui parido pela segunda vez por aquelas duas bolachas.

Eu ficava conversando com colegas da minha idade e, de repente, cantava: “Acendo um cigarro, molhado de chuva até os ossos” ou “E que tantos homens me amaram, bem mais e melhor que você”.

Eu já era estranho naquela época, portanto não surpreende que, ao escrever um livro sobre minha relação com meu filho, eu tenha escolhido como subtítulo “Histórias de um garoto autista e seu pai estranho”. Também não é de espantar o título: a expressão “Meu menino vadio” está no primeiro verso de “Sem fantasia”, composição de Chico Buarque.

Batizar os capítulos do livro com títulos ou trechos de canções é algo artificial; não precisava ser assim. Mas, para mim, foi quase natural. Escrever sobre assuntos tão pessoais sem tocar (em) música é que seria artificial, acho.

A maioria das escolhas derivou-se do significado das palavras, não do sentido das canções das quais foram extraídas. No entanto, com maior ou menor intensidade, gosto de todas as músicas que serviram de inspiração. 

Como mostra do repertório que o livro sugere, selecionei doze canções que me emocionam ou me alegram. A começar, é claro, pela que clama “Vem, meu menino vadio”.

 Ouça a playlist: 


 

>> Leia um trecho de Meu menino vadio

testeUm herói é eterno — e nosso amor por ele, também

Por Liciane Corrêa*
 

Quando o convite para revisar Como treinar o seu dragão chegou, em 2009, eu não sabia que Soluço e Banguela iriam roubar meu coração. Mas, após fechar o pacote para devolver o livro à editora, eu já imaginava que crianças e adultos no mundo inteiro (a série foi traduzida em 37 idiomas) se renderiam aos encantos do herói mais improvável de todos os tempos e seu fiel dragãozinho.

Sou suspeita para falar, porque acho todo livro infantil fofo. A estante aqui de casa é repleta deles. Mas Como treinar o seu dragão vai além da fofura: nas 12 histórias contadas por Soluço, mais uma do ponto de vista de Banguela, temos narrativas inteligentes e inspiradoras, que aguçam e encantam a mente infantil.

O primeiro livro já começa com muita aventura: um menino que se vê em uma situação complicada e, aos tropeços, luta para fazer o que é certo. E a cada livro é uma aventura diferente: surgem novos personagens (alguns amigos, outros inimigos), eles viajam para lugares desconhecidos e cada vez mais longínquos; os perigos e as responsabilidades aumentam à medida que as páginas avançam.

Em algum momento da série, notamos que as tramas estão alinhavadas e que tudo converge para um mesmo propósito. Também percebemos que nosso protagonista cresceu. Soluço — assim como seus leitores — deixou de ser apenas um garotinho para se tornar herói.

Sem esquecermos que as histórias são feitas para crianças, podemos ver que o universo criado por Cressida Cowell é digno de comparação às grandes sagas de fantasia criadas por Tolkien e George Martin. São centenas (sim, centenas!) de personagens, entre humanos e dragões, raças, tribos e lugares, além de um idioma próprio, o dragonês. Toda uma criatividade sem fim na criação dos nomes, que as tradutoras e a equipe da editora tiveram a honra e a dedicação de adaptar com primor: Bafoca de Maluquício, Malvado Melequento, Bastante Bolado, Fabuloso Figurão, Mosca da Tempestade, Pesadelo Monstruoso, Ilha Congelada de Lugar Nenhum, entre tantos outros.

 

Mais do que diversão

E a criatividade de Cressida não para por aí. As ilustrações do livro são superdivertidas, o senso de humor é ímpar, os cenários são descritos vividamente e as cenas de ação, bem-descritas. Meninos e meninas fãs da série, que passaram quase uma década crescendo junto com a saga, tiveram a oportunidade de se divertir enquanto aprendiam lições importantes de aceitação, amizade e espírito de equipe:

– Soluço não se deixa abater pelo fato de ser um menino magrela, diferente do pai e de todo o restante da tribo, a ponto de ser motivo de piada. Pelo contrário: ele usa sua astúcia e inteligência para, pouco a pouco, se tornar um herói viking.

– Pelo bem de seus amigos e por seus ideais, Soluço “cutuca dragões do mal com vara curta”. Quem mais arriscaria a vida para conseguir uma batata, o único antídoto para o veneno que poderia matar o amigo Perna-de-peixe?

– A primeira batalha que nossos personagens enfrentam, no Promontório da Morte, se tornou uma lenda viking. Soluço pode ter sido o grande mentor de tudo, mas Banguela e Stoico tiveram papel crucial na salvação dos Hooligans Cabeludos.

Sim, Soluço não alça seus voos sozinho. Os outros personagens da série têm personalidades bastante diversas. Por isso, é impossível não se identificar com pelo menos um deles: o tímido Perna-de-peixe, a aventureira Camicazi, o cabeça-dura Stoico, o desobediente Banguela, o temperamental Bocão, a mal-humorada Dragoa da Tempestade.

 

Aventuras além do papel

 

Em relação às adaptações cinematográficas da série, produzidas pela DreamWorks, alguns personagens dos livros são completamente diferentes ou não existem. Nosso Banguela, por exemplo, deixa de ser um dragãozinho minúsculo, empoleirado no ombro de seu mestre, para dar vida a um imponente Fúria da Noite, uma das raças mais raras e perigosas.

A gente sempre ouve essa comparação de “o livro é melhor que o filme”, “o filme tem mais ação que o livro” etc. Se alguém me perguntar, vou dizer que adoro os dois. Porque, apesar das diferenças, livros e filmes têm em comum o fato de que olhamos para os vikings e os dragões (bonzinhos) como se fossem nossos amigos: rimos com eles, rimos deles, choramos com eles.

A série de livros foi tão bem-sucedida que inspirou também uma série de animação há quatro anos no ar, quatro curtas-metragens, videogames para várias plataformas, HQs, graphic novels, uma peça que já viajou por cinco países, espetáculo no gelo, action figures da Funko POP! e até brindes do McDonald’s. Uma jornada e tanto! É para nosso herói nunca ser esquecido, mesmo.

 

Liciane Corrêa é tão apaixonada pela série que deixou de comer pizza em Roma para comprar um McLanche Feliz e ter seu próprio Pesadelo Monstruoso. Ela também tem action figure do Soluço, o DVD do primeiro filme (presente do então melhor amigo, que hoje é seu marido) e um gatinho preto muito parecido com o Banguela das telonas.

testeColetânea de contos inéditos de Jojo Moyes será publicada em fevereiro

Paris para um e outros contos, coletânea que reúne dez divertidas e apaixonantes histórias da autora de Como eu era antes de você, chega às livrarias em 15 de fevereiro.

Com mais de 20 milhões de livros vendidos em todo o mundo, Jojo Moyes se consagrou autora de grandes romances. Arrebatadoras, emocionantes, repletas de personagens fortes e realistas, suas obras conquistaram legiões de fãs e alcançaram listas de mais vendidos em diversos países.

Nessa vibrante coletânea, o leitor poderá conhecer mais um lado da autora. Em histórias curtas e divertidas, Jojo, sem deixar de lado as personagens decididas que conquistaram o público, faz sua conhecida mágica de transformar situações comuns em eventos extraordinários.

No conto que dá título ao livro, a jovem Nell planeja um final de semana romântico em Paris com o namorado e fica sabendo, já na estação, que ele desistiu de acompanhá-la. Sozinha em um país estrangeiro, Nell descobre uma nova versão de si mesma, independente e corajosa.

Outros contos incluem um assalto a uma joalheria com uma reviravolta amorosa, a história de uma mulher que passa um dia inteiro com os sapatos de outra pessoa e um shopping lotado de pessoas fazendo compras de Natal que vai revelar a uma esposa estressada o que de fato importa na vida.

E em Lua de mel em Paris, que fecha a coletânea, Jojo Moyes brinda os leitores com um reencontro com as personagens do best-seller A garota que você deixou para trás, Liv e Sophie, que, separadas por algumas décadas, acreditam que o casamento é apenas o início de suas histórias de amor.

 

testeNovidades no elenco da adaptação de Simon vs. a agenda Homo Sapiens para o cinema

Katherine Langford e Logan Miller

Foram divulgadas mais novidades sobre a adaptação cinematográfica do apaixonante Simon vs. a agenda Homo Sapiens. Recapitulando: Nick Robinson, que atuou em Jurassic World: O Mundo dos Dinossauros A 5ª Onda, foi confirmado para o papel de Simon!

Sua grande amiga, Leah, será interpretada por Katherine Langford — que vai estrelar a série do Netflix Os 13 Porquês. Já o “vilão” Martin será vivido por Logan Miller, de Como Sobreviver a Um Ataque Zumbi.

Curtiram as escolhas? Por enquanto ainda não há informações sobre o papel de Blue.

Nick Robinson

O filme inspirado em Simon vs. a agenda Homo Sapiens será dirigido por Greg Berlanti, responsável pela adaptação do universo da DC Comics em produções como Lanterna Verde, Arqueiro Flash, e mais conhecido por seu trabalho nas séries de TV Dawson’s Creek Brothers & Sisters. Com roteiro de Isaac Aptaker e Elizabeth Berger, a produção caberá ao mesmo time que levou A Culpa é das Estrelas para os cinemas.

No romance de Becky Albertalli, Simon tem 16 anos e vive uma paixão secreta e um dilema. Será que precisa mesmo sair do armário e contar aos pais e amigos de infância que é gay? Mas por que ele precisa passar por esse constrangimento? Por que adolescentes héteros não têm que passar por isso?

Simon vs. a agenda Homo Sapiens é mais do que um romance divertido sobre um garoto apaixonado por música, biscoitos Oreo (que, se vocês ainda não sabem, vão descobrir que combinam com TUDO!) e por um misterioso colega que escreve e-mails inesquecíveis com uma gramática perfeita — é uma história de amor que expõe, com muita sensibilidade, a crueldade dos padrões da sociedade em que vivemos.

testeNovo livro de Míriam Leitão reúne crônicas sobre a situação econômica e política atual

Com 25 anos de colunismo diário em O Globo, Míriam Leitão está acostumada a ver além dos acontecimentos. Para a jornalista, a crise pela qual o Brasil passa hoje já estava anunciada havia muito tempo, pois o governo fechou os ouvidos a todos os alertas e a todas as críticas, enquanto fazia escolhas desastrosas.

Em seu novo livro, A verdade é teimosa, Míriam apresenta 118 textos produzidos desde 2010, quando falar em crise econômica parecia um verdadeiro atrevimento, até novembro de 2016, quando o governo Temer atravessava momentos de grande instabilidade política. Com uma linguagem clara, a obra examina os antecedentes que levaram à recessão, à desordem fiscal e à inflação, bem como aos momentos mais agudos da crise em si.

A verdade é teimosa: diários da crise que adiou o futuro será lançado em 10 de fevereiro e já está em pré-venda.

Em 2015, Míriam publicou História do futuro, livro que compila pesquisas, análises, entrevistas e depoimentos para apresentar, de forma acessível, tendências e perspectivas para os próximos anos.

testeProtagonista de Extraordinário nos mostra seu universo em livro infantil totalmente ilustrado

Extraordinário é um livro tão apaixonante que já vendeu quase meio milhão de exemplares só no Brasil e chegará às telas de cinema com Julia Roberts e Jacob Tremblay (o adorável menino de O Quarto de Jack) em novembro de 2017. Auggie Pullman, o menino de dez anos com grave deformidade facial que começa a frequentar a escola pela primeira vez, encanta leitores mundo afora desde seu lançamento, em 2013. Inspirada no universo do personagem, a autora, R. J. Palacio, publicou também 365 dias extraordinários, Auggie & eu e Diário extraordinário — e no fim de março lança o picture book Somos todos extraordinários.
 

Designer gráfica e desenhista, Palacio conta que sempre teve o sonho de ilustrar o próprio livro infantil. Ela se baseou na imagem da capa de Extraordinário, que traduz a imaginação de leitores de toda parte, para criar o universo de Auggie — “um garoto comum com um rosto incomum” — e sua fiel cachorrinha, Daisy. Resgatando elementos da história original e colocando os personagens em um mundo ilustrado que representa a imaginação do menino, Somos todos extraordinários vai deliciar todos os que já se emocionaram e os que ainda vão se emocionar com essa incrível história de superação, seja no cinema ou nos livros, e pode também apresentar Auggie para os que ainda não o conhecem.

testePenas ferinas

 

Daniel Más, foto de Ronaldo Câmara

Daniel Más era uma víbora espanhola que escrevia, no final dos anos 1970, a coluna social do Correio da Manhã. Seu nome precisa ser sempre lembrado quando se fala da última geração do moderno colunismo social brasileiro, aquela que veio, com humor rascante, para acabar com a instituição inventada por Jacinto de Thormes e Ibrahim Sued. Zózimo Barrozo do Amaral foi o maior de todos, com sua pena elegante e ao mesmo tempo ferina. Daniel Más fez o que pôde, com mais estridência, para demolir a ridicularia das velhas senhoras que ostentavam brilhantes de origem duvidosa ao lado dos maridos em black-tie

É verdade que essas vítimas de vez em quando faziam justiça com as próprias mãos — e sobrava uns cascudos, às vezes mais, no cocoruto do colunista do Correio. Daniel era o típico fraco e abusado, mas divertidíssimo.

O banqueiro Antonio Carlos de Almeida Braga, do Bradesco, cruzou com ele no Santos Dumont e e deu-lhe os tais cascudos de praxe. Dias antes tinha sido chamado de “gordo” numa nota. No dia seguinte ao encontro no aeroporto, Braguinha viu no jornal uma correção típica do estilo de Daniel Más: “O banqueiro Braguinha está magro como um sílfide.” E aí só restou a Braguinha cair na gargalhada.

Daniel Más estava no Correio na época em que Zózimo estreou no Jornal do Brasil, em 1969. Em São Paulo, com o mesmo estilo de descrer na humanidade, brilhava Telmo Martino. Os dois são personagens de destaque no meu novo livro, Enquanto houver champanhe, há esperança. Se os colunistas sociais anteriores ficavam deslumbrados com os ricos e lavavam os dedos em lavanda antes de batucar seus elogios, Daniel e Telmo tratavam-nos sem cerimônia. Zózimo, como era o mais elegante, e também gostava de um pugilato quando ele se apresentava, geralmente com torcedores rivais do Flamengo, não apanhou. 

Por causa de sua coluna serelepe, que dava um sacode no gênero, Daniel Más recebeu piparotes de variadas ordens de violência. Seus algozes eram grã-finos como Paulo Marcondes Ferraz, José Colagrossi e Eric Waechter. No dia seguinte aos cascudos, para esconder essas avarias, ele chegava à redação com óculos escuros da melhor grife. Era sua vingança. Pulava na mesa e gritava:

— Chegou o sol, e o sol sou eu.

Era um tempo em que as colunas não chamavam ninguém de “boa praça” nem “meu querido”, um expediente comum nas hoje porque o colunista sabe que todo mundo gosta desses carinhos e, em troca, o homenageado pode lhe depositar alguma informação no colo para a coluna de amanhã. É dura a vida do colunista. Daniel Más, quando não tinha as notas verdadeiras, inventava outras. Aos poucos, foi ficando sozinho, as portas batendo-lhe na cara, e acabou trocando o colunismo pelo roteiro de novelas. Emplacou algumas na TV Globo até falecer, em 1989. 

Era amigo de Zózimo e, na boa tradição das amizades inteligentes, sacaneavam-se. “O colunista Daniel Más, na plateia do Teatro Municipal, vendo Ella Fitzgerald, estava elegante no seu conjunto de colete e terno roxo-quaresma”, escreveu Zózimo, como se alguém pudesse ficar elegante num charivari cromático daqueles. No dia seguinte, estava no Correio a resposta de Daniel. “Zózimo Barrozo do Amaral finalmente aparou o bigode”, alfinetou, achando old fashioned a mania do amigo de cultivar um bigode que não se via mais em rosto jovem.

A foto de Daniel que ilustra este post (com a língua de fora, é claro, tripudiando da humanidade sem graça) é de Ronaldo Câmara, um dos acervos mais preciosos da gente que fez a história do Rio de Janeiro entre as décadas de 1960 e 80. Ronaldo fotografou todo mundo que importava naquele período. Íntimo de seus personagens, flagrava-os sem pose. A propósito, ele clicou Daniel Más fazendo um striptease — mas isso fica para um próximo post. Sempre será preciso renovar a lição de Daniel, de Zózimo e das fotos de Ronaldo Câmara: enquanto houve humor, há esperança.

testeMax Perkins na Netflix

“Não há nada tão importante quanto um livro”, escreveu Max Perkins, um dos mais importantes editores norte-americanos. Levando a sério a frase escrita em uma carta, Max Perkins dedicou a sua vida à literatura e fez história ao revelar talentos como F. Scott Fitzgerald, Ernest Hemingway, Thomas Wolfe e Taylor Caldwell nos anos 1920.

A trajetória de Perkins — pessoal e profissional — é contada em detalhes em Max Perkins: um editor de gênios.  Por 36 anos, ele foi muito mais que um editor.  Foi crítico, terapeuta, financiador, administrador de carreiras, confidente e amigo de escritores que viriam a se tornar alguns dos maiores nomes da literatura no século XX. Apesar de permanecer invisível por trás dos autores, Perkins se tornou uma lenda no mercado editorial.

A biografia, publicada pela Intrínseca em 2014, foi adaptada para os cinemas e está disponível na Netflix. O mestre dos gênios conta com Jude Law, Colin Firth, Nicole Kidman, Laura Linney, Vanessa Kerby, Guy Pearce e Dominic West no elenco. Assista ao trailer:

testeO universo não se importa. Ainda bem.

Por Bruno Machado*

Buracos negros não se importam com nada. (Fonte)

É comum acreditar que, quando todas as coisas parecem dar errado, existe alguma conspiração universal focada em acabar com os seus planos. Tudo parece desandar, as pessoas horríveis surgem a todo momento e o pessimismo cresce com força total. Nessas horas, é importante lembrar: o universo não está dando a mínima para o que acontece na Terra, e é maravilhoso que ele funcione assim.

Essa informação parece um convite ao pessimismo, mas na verdade é uma verdadeira bênção. Se somos insignificantes perante a magnitude do cosmos, é de se pensar que conspirações, sejam elas divinas ou meramente mundanas, não se apliquem a nós, humanos. E que tudo que fazemos ou deixamos de fazer não depende de sorte ou crença, e sim de trabalho árduo. Lendo o novo livro do físico Stephen Hawking, Buracos negros, é possível perceber que a nossa melhor característica para a galáxia é a irrelevância.

Em duas palestras à BBC, Hawking apresenta uma informação interessante: buracos negros não se importam com nada, e você deveria ser um pouco assim. Depois de anos de teses, artigos, livros, palestras, o objetivo do físico é o mesmo: mostrar que a ciência pode não ser tão complicada assim.

“Dizem que às vezes a realidade é mais estranha que a ficção. Em nenhum lugar isso é mais verdadeiro que no caso dos buracos negros. Os buracos negros são mais estranhos que qualquer coisa já sonhada por escritores de ficção científica, mas são fatos do mundo da ciência.”

No livro, o autor/cientista explica que, até que seja provado o contrário, nada passa despercebido por um buraco negro. Mesmo a luz fica presa no horizonte de eventos (de uma forma resumida, é a “borda” do buraco negro). E o que está dentro de uma dessas estruturas espaciais? Ninguém sabe com certeza. O físico até aponta que, se buracos negros expelissem qualquer tipo de informação, seria algo tão aleatório que a chance de sair uma nave espacial, uma enciclopédia em capa dura ou um vaso de plantas é exatamente a mesma.

Brincadeiras à parte, Hawking explica que a ciência dos buracos negros é algo tão complexo e colossal que, se um dia formos capazes de entender o funcionamento de uma dessas coisas, a humanidade dará início a uma nova era, na qual a compreensão e o debate sensato substituirão o espetáculo de sandices e absurdos que vivemos hoje.

Então, enquanto a ciência não conseguir explicar algo que mais parece saído de um livro de ficção científica, seguiremos flutuando pelo espaço em nosso planeta quase-não-tão-azul-assim. Nossas brigas, disputas e sentimentos continuarão não importando nem um pouco, e talvez seja uma boa ideia repensar o tamanho daquela discussão que você teve com seus pais ou o quanto o estresse do trabalho influencia a sua vida. Enquanto isso, o universo segue seu caminho como o esperado. Ainda bem.

>> Leia um trecho de Buracos negros

 

* Bruno Machado é um ser da espécie Homo sapiens que habita o planeta Terra e que por acaso trabalha como assistente de mídias sociais na Intrínseca e nunca conseguiu ir num planetário mesmo que a editora seja do lado de um. Coincidência, não?

testeTalento Vs. Esforço

Por Roberto Jannarelli*

Michael Jordan é a prova que esforço é indispensável. (Fonte)

Vou contar um segredo para vocês. Minha chefe, que já escreveu muitos textos aqui para o blog, não sabe, mas quando deixou sob minha responsabilidade o livro Garra, de Angela Duckworth, me fez um grande favor. Eu lembro que pesquisei brevemente sobre o livro e logo de cara a premissa me encantou. A autora defende a ideia de que uma mistura de paixão e perseverança, que ela chama de garra, pode suplantar a cultura do talento.

Não posso negar que houve uma identificação com a teoria. Explico: antes de trabalhar com livros, minhas carreiras de halterofilista e Mister Universo foram calcadas em muita dedicação e pouquíssimo, diria que quase nenhum, talento — mas como eu ainda não possuía garra, acabei no mercado editorial mesmo.

Brincadeiras à parte, a ideia de que determinação e força de vontade podem superar o talento de fato me é muito cara, e realmente sempre me identifiquei mais com os determinados do que com os talentosos. Nada contra os talentosos, inclusive tenho muitos amigos que são, mas o êxito alcançado depois de muito esforço me parece mais satisfatório do que um simples dom divino que te deixa bom em tudo.

Em Garra, Angela usa muitos exemplos de sucesso que são inspiradores. Empresários, empreendedores, acadêmicos, atletas olímpicos e profissionais, todos com uma história que comprovam a tese: não teriam vencido se tivessem dependido do talento, ou ao menos apenas do talento. São muitas histórias mesmo, todas muito interessantes e que devem causar identificação de acordo com a trajetória de cada leitor, por isso pensei em destacar aqui as minhas preferidas:

Academia Militar West Point

“Quando um cadete pisa no campus de West Point, ele fez por merecer”. Essa é conclusão da própria autora, que estudou a fundo o processo de admissão na Academia Militar norte-americana. Esse, aliás, foi um dos primeiros e principais projetos dela na tesa de Garra, mas não da maneira mais simples que podemos imaginar. Angela não estudou o processo de aprovação na Academia, mas a permanência dos cadetes aprovados.

O processo seletivo de West Point consiste em provas teóricas e práticas, além de testes físicos e uma avaliação das notas no ensino médio. São indispensáveis notas altíssimas em todas as etapas. Depois das provas, os cadetes são classificados de acordo com uma Pontuação Integral do Candidato. Ou seja, depois da classificação, todos sabem quem é o primeiro da turma, o segundo, e assim por diante até o fim da lista aprovados.

Logo no início, os calouros participam de um exaustivo período de sete semanas de treinos carinhosamente apelidado de “Beast Barracks” (algo como “Quartel das Feras”), no qual os cadetes são submetidos a séries brutais de exercícios intercalados com aulas teóricas, tudo isso começando às 5h30 e com toque de recolher marcado para 22h, sem pausas de fim de semana nem feriado.

Como a taxa de desistência depois do Beast era enorme, Angela levantou o seguinte questionamento: por que alguém que passou dois anos tentando entrar numa instituição a abandona nos dois primeiros meses?

Depois, a autora seguiu em frente e se perguntou quem então seriam os desistentes e quem passava por essa fase e se formava na Academia. A surpresa foi que não havia nenhuma relação entre a Pontuação Integral do Candidato e a capacidade de superar o Beast, isto é, os primeiros colocados no sistema de notas (uma das maneiras de se classificar o talento são as notas, certo?) eram superados com frequência por aqueles que não se destacaram na seleção.

Foi então que Angela Duckworth conseguiu implementar a ideia de que a garra poderia ser mais importante que o talento para se alcançar o sucesso em um dos ambientes mais rígidos da cultura norte-americana. E a partir daí seu conceito de garra foi inserido em diversos processos seletivos dos Estados Unidos.

Angela Duckworth — Ela mesma

Uma história que percorre vários momentos de Garra é a da própria autora. Logo no início do livro ela conta que foi criada em um ambiente muito exigente. Seu pai, um cientista e estudioso, dizia com naturalidade que a filha era inteligentíssima, mas que “de gênio não tinha nada”. Isso não apenas em referência a notas do colégio ou qualquer outro tipo de teste; desde sempre. Imagine você, uma criança feliz entregando um desenho feito especialmente para seu pai e ouvindo essa resposta. Pois é, foi nesse ambiente que Angela foi criada.

Primeiro, o que me tocou nessa história foi a habilidade da autora de contar isso tudo sem rancor. Ela de fato entendia o pai, cientista, racionalista, e que na verdade tinha razão. Angela não era um gênio na juventude. Ela conta no livro que não participou de nenhuma turma avançada nas disciplinas que queria durante o ensino médio e que toda a sua trajetória posterior como pesquisadora foi baseada na dedicação exaustiva, muito estudo, para que finalmente pudesse ser agraciada com as principais bolsas de estudo dos programas de pós-graduação em psicologia, área em que hoje é considerada referência.

De uma maneira simpática, emocionante, Angela Duckworth mostra como ela própria é um exemplo de que a garra foi mais importante que o talento para alcançar o sucesso na área acadêmica — e para ter o reconhecimento de seu pai, o que emociona ainda mais o leitor.

Kevin Durant e Michael Jordan

A última das três histórias de superação tem a ver com uma área de afinidade minha. Como disse antes, a autora usa muitos exemplos de atletas na pesquisa. Dessa forma, o leitor pode se identificar com a modalidade que mais gosta — se você gostar de esportes, claro.

No meu caso, foi a história do jogador de basquete Kevin Durant, um dos melhores jogadores da NBA atualmente. No livro, ele explica como treina sozinho até dominar os movimentos, depois em dupla, depois em dupla com defesa, depois em trio, e assim progressivamente até praticar com o restante do time em treinos “normais” de cinco contra cinco. Isso tudo com supervisão e análise de porcentagem de acerto para saber o momento certo de mudar de fase. A autora chama esse tipo de treino de prática disciplinada, uma das ferramentas para o desenvolvimento de uma cultura de garra — porque sim, a garra não é uma habilidade inata, ela pode ser desenvolvida.

É claro que tudo isso ficou muito mais claro para mim depois de ler Garra, mas talvez eu tenha gostado tanto da tese de Angela Duckworth por conta da identificação com as histórias pessoais contadas no livro. No meu caso, os exemplos esportivos foram muito importantes para causar essa empatia. Ao contrário do halterofilismo, o basquete não foi uma prática que ficou no campo da ficção na minha adolescência. E de uma maneira inconsciente, foi por meio da prática desse esporte que eu percebi que estava mais para o time dos esforçados do que o dos talentosos. E não tenho vergonha nenhuma disso.

Para terminar, vou contar uma história, não minha, mas de um cara chamado Michael Jeffrey Jordan. Você talvez se lembre dele se tirar nome do meio. Quando eu treinava meus arremessos, na longínqua época em que tinha quinze anos, descobri que, no ensino médio, esse cara só tinha conseguido a vaga no time do colégio no último ano antes de ir para a faculdade. Jordan passou os três anos anteriores sendo cortado nos testes. Mesmo assim, quando alcançou o objetivo, nem de longe foi considerado o melhor jogador na sua idade no país — foi “só” um ótimo jogador, ou, como diria o sr. Duckworth, “nenhum gênio”. Continuou treinando muito, aprimorando suas técnicas e, por isso, quando se formou na escola, conseguiu vaga no time de uma das mais tradicionais universidades do país. Lá, foi campeão no primeiro ano, fez cestas importantes, foi um dos principais jogadores. Mas não o principal; nunca foi “o cara”, era só mais um entre os melhores.

No momento de ele se profissionalizar, dois times preferiram outros jogadores e deixaram de contratá-lo, ficando Jordan em terceiro na lista dos calouros da NBA em 1984. Mas ele continuou praticando, melhorando cada detalhe possível, até chegar o momento em que dominou o esporte. Ganhou seis títulos da NBA, duas medalhas de ouro em jogos olímpicos, inúmeros prêmios individuais e, sem exagero, fez o jogo parecer fácil. Esse vídeo explica um pouco o que quero dizer: Michael Jordan, somente o melhor jogador de basquete de todos os tempos, também não foi um produto apenas do talento; o diferencial dele foi a garra mesmo.

Guardadas a proporções e diferenças nas atividades, a história de Angela Duckworth me lembrou muito a desse ídolo do esporte. Ela também trabalhou muito para, de uma aluna mediana no ensino médio, ser uma pesquisadora notável no campo da psicologia. Seu pai que me desculpe, mas Angela se tornou sim um gênio. E escreveu um livro que, além de nos dar exemplos de histórias em que a garra supera o talento, ensina a desenvolvê-la, seja para uso pessoal, da equipe que você gerencia, ou na criação de seus filhos.

Em outras palavras, Garra dá todas as ferramentas para que você escreva a sua própria história de superação.

Agora é com você.

 

* Roberto Jannarelli é editor assistente de livros estrangeiros da Intrínseca e tomou para si a prática de disciplinada de não contar histórias da sua adolescência o tempo inteiro para os colegas de trabalho. Às vezes é difícil, mas ele tenta.