testeViolência, política e música na Jamaica de Marlon James

Marco Antonio Barbosa*

Esta é a história dos foras da lei de West Kingston. Um faroeste precisa de um mocinho para usar o chapéu branco e um bandido para usar o preto, mas, na verdade, a realidade da periferia está mais próxima do que Paul McCartney disse sobre o Dark Side of the Moon, do Pink Floyd. Tudo é sombrio. Cada guerreiro é um caubói sem casa, e cada rua tem um tiroteio escrito com sangue em alguma canção.

A vida humana parece valer pouco em Kingston, capital da Jamaica. Até pouco tempo, o país detinha a mais alta taxa de assassinatos per capita do mundo. Na década de 1970, a vida valia ainda menos. Nessa época, as disputas entre gangues iniciadas pouco depois da independência da Jamaica, em 1962, viram uma escalada de violência sem precedentes — uma guerra que incluía disputas políticas, interferência da CIA e a expansão de uma lucrativa rede de tráfico de drogas. Tudo isso em um momento que o país ganhava inesperada relevância global com a ascensão do reggae, movimento liderado por Bob Marley e The Wailers.

É com essa Kingston dos anos 1970 que Marlon James abre Breve história de sete assassinatos, obra que explora as últimas quatro décadas de história da Jamaica em mais de 700 páginas. O romance não poupa o leitor (e muito menos os personagens) ao descrever a miséria e a violência reinantes na periferia da capital e as ligações perniciosas entre a “cidade baixa” (onde ficam as favelas) e a “cidade alta” (onde vivem os ricos e poderosos). Dezenas de personagens dão voz à narrativa, em uma alternância de pontos de vista que revela uma complexa rede de motivações e sentimentos conflitantes. A coragem do escopo, a contundência da trama e a ambiciosa polifonia valeram a Marlon James o Man Booker Prize de 2015, o mais prestigiado prêmio literário do Reino Unido. O autor, nascido em Kingston em 1970, foi o primeiro jamaicano a receber a honraria. (Há anos, James não vive mais na Jamaica; a violência o fez emigrar.)

Marlon James por Jeffrey Skemp

 

A menção a Bob Marley no início deste texto não foi gratuita. O rei do reggae — ou melhor, o Cantor, nome que James usa para se referir a Marley no livro — é um dos personagens mais importantes do capítulo inicial. O autor destaca em toda a obra a importância da música popular como válvula de escape para a pobreza; não por acaso, as partes que compõem o livro são batizadas com títulos de clássicos do reggae. Além de ser o jamaicano mais famoso do mundo nos anos 1970, Marley detinha grande influência entre políticos e criminosos em Kingston.

James explora essas conexões no primeiro capítulo, que culmina com o atentado à vida do astro, ocorrido em 3 de dezembro de 1976. Como muitos dos principais acontecimentos do romance, trata-se de uma história nebulosa que une criminalidade e política, apresentada sob várias perspectivas. Bob Marley preparava-se para um grande show ao ar livre, o festival Smile Jamaica, e o evento tinha o intuito de apaziguar a violência na periferia e unir o povo. Dois dias antes da apresentação, homens armados invadiram a casa do cantor (ou Cantor) e o balearam, atingindo também sua esposa Rita e seu empresário Don Taylor. Ninguém morreu, ninguém foi preso, e até hoje, ao menos oficialmente, a identidade dos atiradores ainda é desconhecida.

O que se sabe é que o Smile Jamaica foi usado pelo então primeiro-ministro jamaicano, Michael Manley (do Partido Nacional Popular) como arma política — o que certamente desagradou seu principal adversário, o Partido Trabalhista da Jamaica. Tanto o PNP quanto o PTJ tinham braços armados, recrutados entre os gângsteres da periferia. Os Estados Unidos também estavam de olho no cenário, fornecendo armas aos “militantes” do PTJ (que se opunha às políticas esquerdistas de Manley). Bob Marley desejava que o show não tivesse conotações partidárias, mas não só fracassou nesse intuito como quase morreu. É em meio a esse furacão caribenho que Marlon James traça Breve história de sete assassinatos.

A narrativa de Breve história de sete assassinatos se inicia em West Kingston, a área mais barra-pesada de uma das capitais mais perigosas do mundo. Marlon James toma algumas liberdades criativas, mas dá a noção exata da pobreza e da violência que dominam a região.

 
 
 

…E SUAS PERSONAGENS

Além de Bob “Cantor” Marley, Marlon James se apropria livremente de outras pessoas para criar alguns personagens:

 

A experiência de ler a obra de Marlon James dialoga com outros universos conhecidos, como o mundo cão de Cidade de Deus, de Paulo Lins. Além disso, a riqueza da linguagem, que incorpora as gírias e expressões próprias do gueto jamaicano, evoca a liberdade semântica de autores como Roddy Doyle (outro vencedor do Man Booker Prize) e Irvine Welsh (com sua recriação dos dialetos proletários da Escócia). Breve história de sete assassinatos é uma leitura única, em que a confluência de vozes, as motivações e a contundência descritiva amplificam a humanidade dos personagens.

>> Confira a participação de Marlon James na Flip

>> Ouça a playlist inspirada em Breve história de sete assassinatos

 

Marco Antonio Barbosa é jornalista desde 1996. Passou pelas redações de Jornal do Brasil, Extra, Veja Rio e Globo.com, escrevendo sobre cultura, mídia e comportamento. Hoje publica textos inéditos em https://medium.com/telhado-de-vidro.

testeInventar o real, inventar a si mesmo

Suelen Lopes*

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Baseado em fatos reais, de Delphine de Vigan, é um dos livros em que mais gostei de trabalhar desde que entrei na Intrínseca. A autora, que ficou conhecida por suas obras com traços autobiográficos, se destacou na cena literária francesa principalmente depois de Rien ne s’oppose à la nuit, escrito após o suicídio da mãe e lançado em 2011. No romance, Delphine evoca doces lembranças ao mesmo tempo em que conta como a mãe, que era bipolar, pouco a pouco sucumbiu ao delírio e à loucura diante das filhas, e revela segredos familiares perturbadores.

Rien ne s’oppose à la nuit alcançou um estrondoso sucesso na França, e após quatro anos de silêncio De Vigan lançou Baseado em fatos reais. Logo nas primeiras páginas, a narradora, que também se chama Delphine, se vê diante da temível pergunta: o que vem depois de um texto pessoal que comoveu tantos leitores? Para Delphine, a resposta era a inércia, a fragilidade, o isolamento, a depressão e o bloqueio criativo. Delphine de Vigan e Delphine, a narradora do livro, claramente têm inúmeros pontos em comum. Coincidência? É provável que não.

untitledEm meio a esse cenário de vulnerabilidade, a narradora conhece a ghost-writer L., uma mulher sofisticada, confiante, feminina, carismática e atraente. Tudo o que Delphine sempre desejou ser. A amizade, no entanto, se torna cada vez mais possessiva. L. tem um passado obscuro e entra de modo insidioso na vida da escritora, que encontra na relação uma saída para superar o bloqueio criativo. L. parece ser a amiga perfeita, sempre disponível, mas logo passa a interferir nos aspectos mais íntimos da vida de Delphine. A conexão entre as duas parece inacreditável — e bastante perturbadora. L. tenta fragilizar e manipular a amiga, o que estabelece um clima sombrio e de suspense ao longo da história.

No início, o livro remete a uma narrativa pessoal, mas então se transforma em um thriller psicológico que joga com os códigos da autoficção, questiona o fazer literário, o fascínio da nossa sociedade por narrativas baseadas em fatos reais — seja na literatura, no cinema ou na TV —, e as aparentes dicotomias com as quais costumamos nos deparar, como público e privado, razão e loucura, normalidade e anormalidade, verdade e mentira. De Vigan lança muitas pistas falsas (ou não, quem sabe?) para estabelecer uma atmosfera confessional que coloca em xeque a fronteira entre real e ficção.

Baseado em fatos reais traz uma narradora-autora de contornos bastante nebulosos, cria uma esfera ficcional do que é real e também do próprio eu. Não é por falar de sua vida nos livros que as pessoas conhecem a verdadeira Delphine de Vigan. Na verdade, são momentos recortados e colocados em evidência. Delphine brilha nesse palco em que vida e literatura não se separam por completo. O interesse está no movimento de construção da narrativa, de costurá-la e inventá-la, mais do que dizer se uma coisa de fato aconteceu ou não.

A autora parece partir da própria história e de suas questões mais íntimas para dar outro significado à dor. Na vida real ela tem um namorado que se chama François e é crítico literário, como no livro? Sim. Tem dois filhos? Sim. Os filhos se chamam Louise e Paul como na obra? Não. Ela enfrentou crises de depressão? Talvez. L. realmente existiu em sua vida? Delphine de Vigan faz questão de responder que, de uma forma ou de outra, sim. Qual parte é construção? O que não é? O interessante é perceber que talvez essas não sejam as perguntas mais relevantes. Baseado em fatos reais recorre à desconstrução dos limites entre real e ficção acreditando que vida e linguagem caminham lado a lado para possibilitar as vivências em toda a sua humanidade, com o que elas trazem de bom e de ruim. Para mim é sempre maravilhoso quando encontro um livro que me toca a ponto de fazer com que eu queira me entender melhor e me reinventar. Espero de verdade que vocês gostem de lê-lo tanto quanto eu gostei de trabalhar nele.

>> Leia um trecho de Baseado em fatos reais

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*Suelen Lopes é editora assistente no setor de ficção estrangeira da Intrínseca. Gosta de chá, cachorros e francês, e acredita que dar voz à vulnerabilidade humana ainda vai mudar o mundo.

testeLeitores perguntam e #MíriamResponde

Míriam e Cora

A conversa virtual de Miriam Leitão, autora de Tempos extremos, com os leitores pelo Twitter foi um sucesso. A ação contou com a ilustríssima mediação da jornalista Cora Rónai e durou pouco mais de uma hora. Confira abaixo a íntegra desse bate-papo sobre o livro, a literatura, a importância de Machado de Assis e tantos outros assuntos.

Confira o regulamento.


testeDeu pra reconhecer?

Antes de adquirirem aparência pálida, dentes afiados e olhos que mudam de cor, os atores de Crepúsculo atuaram em papéis bem distintos dos que os deixaram famosos. Na pele de personagens comuns ou bastante fantasiosos, alguns deles passam quase despercebidos pelo público, mas nós mostramos a vocês o que eles fizeram antes de virarem vampiros consagrados no cinema.

Kristen Stewart começou na sétima arte bem cedo, aos 11 anos, no filme de suspense O quarto do Pânico, ao lado da atriz Jodie Foster. No longa, ela e a mãe tem a casa invadida por três homens e se abrigam em um quarto secreto, construído para emergências.

Pouca gente sabe que antes de ser sucesso como o lobisomem Jacob, Taylor Lautner fez papel de um garoto – tubarão no filme As aventuras de Sharkboy e Lavagirl (2005). Aos 13 anos, ele protagonizou o filme ao lado de Lavagirl (Taylor Dooley), a jovem vulcânica que lança chamas e pedras incandescentes.

De bruxo a vampiro: o interesse de Robert Pattinson pelo mundo da fantasia parece ser antigo. Em 2005 ele participou do filme Harry Potter e o Cálice de Fogo, como Cedrico Diggory. Sem possuir a imortalidade de Edward, seu personagem morre ao cair numa armadilha preparada para Harry Potter na última prova do Torneio Tribruxo.

Uma das personagens mais difíceis de reconhecer, sem dúvida, foi a vivida por Elizabeth Reaser (a Esme Cullen, de Crepúsculo) no seriado Grey´s Anatomy. Ela participou de 17 episódios na pele de Ava, uma jovem que sofreu um acidente e teve o rosto desfigurado. Para piorar a situação ela também perde a memória o que torna impossível sua identificação.

Mas logo o jogo vira e Ava ganha um novo rosto e um novo namorado, o doutor Karev, vivido por Justin Chambers.

Tragédias a parte, às vezes uma simples mudança no cabelo já faz você precisar olhar duas vezes para identificar um ator. Esse é o caso de Nikki Reed, a loiríssima Rosalie Cullen de Crepúsculo, que em The O.C. é a morena Sadie Campbell.

Com o cabelo mais escuro e aparência mais radiante sua personagem teve um caso com o protagonista Ryan (Benjamin McKenzie). No entanto, ela não foi a única da série vampiresca a se aventurar pelo seriado. The O.C. também foi a casa de Jackson Rathbone, o Jasper da saga de vampiros e de Cam Gigandet, que mostrou toda a sua vilania, tanto no filme, na pele de James, quanto na TV, no papel de Kevin Volchok, o responsável pela morte de Marissa Cooper (Misha Barton) —  outra protagonista do seriado.