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Sexo, dinheiro e poder

16 / setembro / 2022

“Me ajuda a acabar logo com isso. Vai ser a nossa independência financeira.”

 

Essa foi a mensagem que a pastora e deputada federal Flordelis enviou por WhatsApp a seu filho afetivo, André, meses antes de seu marido, Anderson do Carmo, ser assassinado a tiros na porta da casa da família, em Niterói. O corpo da vítima possuía trinta perfurações, sendo que nove se concentravam na região pélvica e nas coxas, o que sugeria um ato de vingança de cunho sexual.

De temperamento impositivo, era Anderson quem administrava financeiramente a casa da família, distribuía os salários dos “filhos” e fiscalizava o da própria deputada, além de ser o responsável por ditar o modo como Flordelis deveria se comportar: desde a escolha do vestuário até o modo de sentar-se, tudo passava por Anderson. Ele só não imaginava o quanto esse comportamento controlador estava incomodando a esposa e os “filhos”.

Casa de swing, sexo em vias públicas, tentativas de envenenamento e planos de assassinato que deram errado: após o homicídio, as investigações revelaram uma complexa rede familiar baseada em poder, mentiras e dinheiro.

 

O início de um sonho

Após namorar por um breve período com Simone, filha biológica da pastora, Anderson assumiu publicamente uma relação conjugal com Flordelis — ela, com 31 anos e ele, com apenas 15. Desde que se casaram, em 1994, os dois formaram uma família inspiradora por conta da grande quantidade de “filhos”. Tinham o total apoio da comunidade e da mídia, além de empresários e celebridades que contribuíram financeiramente com sua manutenção.

Responsável por transformar a simples missionária em pastora renomada, Anderson era o principal mentor das carreiras religiosa e política da esposa. Decidido a ampliar, cada vez mais, a influência política e religiosa de Flordelis, Anderson controlava todos os aspectos da vida pessoal e financeira da pastora e dos “filhos”.

Anderson não admitia palpites em sua forma de conduzir os assuntos na política e nas finanças da família. De acordo com depoimentos, ao mesmo tempo que mantinha rédea curta nos gastos dos “filhos”, suas despesas pessoais superavam cem mil reais. Anderson certamente não imaginava o quanto esse domínio sobre a mulher e a família os estava incomodando.

 

Deu tudo errado

Após o assassinato, a fachada da família feliz e do casamento perfeito, cuidadosamente construída por Flordelis e Anderson durante 27 anos, começou a ruir. Além de apontar evidências importantes de que o crime teria sido cometido por uma pessoa próxima, a polícia revelou detalhes polêmicos sobre a vida íntima da ex-deputada e de sua família.

Um dos pontos principais revelados pela investigação foi que, meses antes de ser assassinado, Anderson havia descoberto um plano para matá-lo — que apareceu por engano em seu iPhone — e mostrado a um de seus filhos. O texto teria sido escrito originalmente no iPad da casa, ao qual apenas algumas pessoas teriam acesso, e ido parar em seu telefone graças a uma sincronização da nuvem.

Além disso, a cena do crime foi alterada pela própria família antes que os investigadores chegassem ao local, na trágica madrugada de 2019. O silêncio dos cachorros — que sempre latiam quando estranhos entravam na residência — naquela noite também aumentou a suspeita da polícia quanto à participação de familiares no crime.

Outro ponto polêmico e curioso revelado pela polícia foi que o histórico de busca de uma das filhas de Flordelis continha pesquisas sobre diferentes tipos de venenos, onde comprá-los e como encontrar assassinos de aluguel. Logo depois, as investigações mostraram que, de fato, Anderson vinha consumindo microdoses de arsênio, dissolvidas na comida e nas bebidas que consumia em casa. Isso explicaria porque, a partir de 2016, ele passou a apresentar sintomas como febre, diarreia e dores abdominais de forma constante, situação que o  levou a ir diversas vezes ao pronto-socorro.

Poucos dias após o crime, Flordelis concedeu uma entrevista a um famoso programa de televisão e revelou que, na madrugada do crime, ela e Anderson estavam em Copacabana, no Rio de Janeiro. A fim de mostrar que os dois continuavam apaixonados depois de tantos anos de casamento, a pastora contou que ela e o marido tiveram relações sexuais em cima do capô do carro em uma rua escura do bairro. Esse detalhe chamou a atenção da mídia, já que sexo em público não condizia com a postura conservadora da família, tanto sob a ótica da religião quanto a da política. Ainda, durante o julgamento do caso, uma empresária afirmou que Anderson e Flordelis frequentavam a casa de swing que ela administrava em 2007. Flordelis desmentiu a informação e ameaçou processá-la — o que nunca aconteceu.

Será que o rígido controle de Anderson sobre a vida da esposa e dos “filhos” teria sido o que destruiu a relação e decretou sua sentença de morte?

Alguns dos “filhos” de Anderson já foram condenados por participarem do crime, enquanto outros ainda aguardam julgamento em regime fechado. O mandato de Flordelis foi cassado em 2021, mas o julgamento está marcado para dezembro deste ano, após ter sido adiado duas vezes.

 

Leia também: Um crime real que parece ficção e Filhos preferidos, maus-tratos e violência doméstica marcaram as investigações do caso

 


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