A sociedade brasileira está mudando e vai mudar mais. Nas últimas décadas, vimos um crescimento significativo no poder de consumo do brasileiro. Houve muito debate sobre o que havia permitido esse avanço: se o plano de estabilização ou as políticas de transferência de renda. O debate não faz sentido porque os dois eventos são complementares. O crescimento econômico nas últimas duas décadas, o Plano Real e as políticas públicas de distribuição de renda fizeram com que milhões de pessoas tivessem a oportunidade de consumir mais. Chegou-se a dizer que havíamos criado uma “nova classe média”. Aí veio a recessão e, com ela, o desemprego. Isso mudou tudo? Em ambiente adverso na economia, o país e as famílias vivem retrocessos, mas isso é apenas conjuntural.
A grande questão é mais estrutural: o Brasil se tornou, com as políticas sociais, um país menos desigual? No livro História do futuro: o horizonte do Brasil no século XXI, debato o assunto com detalhes, apresento novos dados e histórias reais que demonstram que existem alguns mitos sobre a melhora na igualdade social nos últimos anos. O maior problema que enfrentamos para um diagnóstico da nossa situação é a fraca base de dados para analisar a questão da desigualdade com a profundidade sugerida pelo economista francês Thomas Piketty.
Os professores da UnB Marcelo Medeiros, Pedro Souza e Fabio Ávila Castro fizeram uma pesquisa que derrubou um pouco a ideia, defendida em anos recentes, de que o país tivesse reduzido a desigualdade. Infelizmente, ainda não. Com base em dados da Receita, analisaram a evolução da distribuição de renda entre 2006 e 2012. A desigualdade no Brasil é muito alta e estável. O 1% mais rico da população adulta concentra mais de 1/4 de toda a renda do país. Os 5% mais ricos detêm quase metade da renda. A concentração é tamanha que um milionésimo das pessoas acumula mais renda do que toda a metade da população junta. Em suma, não houve movimento claro de mudança de desigualdade no período pesquisado.
Os desafios dos pobres são maiores do que mostram os indicadores econômicos. O racismo dificulta a ascensão dos negros. As mulheres são discriminadas no mercado de trabalho e recebem menos mesmo quando exercem a mesma atividade. E tudo piorou na crise. Quando a recessão se aprofundou, o desemprego afetou mais as mulheres e os negros.
A desigualdade é a pesada herança que trazemos do passado e temos confirmado no presente. Há muito trabalho a fazer para combatê-la. O importante é ter em mente que esse sonho não pertence a um grupo político, tem que ser do país como um todo. Se entendermos assim, o futuro estará mais próximo.
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